segunda-feira, 7 de junho de 2010

A TRAVESSIA


Para trás ficou o penoso percurso.
Montanhas, desertos e mares, suas tempestades e bonanças  e  os amargos sabores da conquista e da derrota.
Alguns, sábios, débeis ou prudentes, pelo caminho se quedaram e eu, por castigo ou prémio, cumpri uma jornada extensa e eis-me aqui, neste planalto de tantas almas, à beira do grande fosso, aguardando chamada à prova final.
O imenso areal, plano, árido e gélido, o impedioso e pesado silencio que uma brisa ligeira quebra no marulhar das águas negras e sangrentas, ocaso simulado no pôr do sol da vida.
Para além do fosso o horizonte difuso a esconder o desconhecido, quiçá disfarçando o nada.
Balanceada, aproxima-se a barca e, como figura de proa, altaneira, negra e sinistra a ceifeira.
Seguir-se-á atracagem, chamada e o desejo de constar da listagem e, quem sabe, posto o pé na barca, a esperança que se esvaiam as boas e más memórias, conquistando finalmente a liberdade..
Terei de embarcar, se não por mérito no menos por ter de ser, recebendo então carta de alforria que permitirá não retornar, ao invés do que muitos acreditam e anseiam.




Não sendo de amor é todavia de cansaço.
Ou talvez de coração e também merece a flor.   Porque não ?

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